Estado de conservação: Bom exemplar
Referência: 2304076
Quero perante esta decente assembleia, confessar a mea
culpa: introduzi, inoculei na intranquila residência do dito o mais contagiante
vírus desde a década de 50, o Rock e os seus bacilos, contrariando-lhe a sua
solidão no meio de 127 pessoas que, por norma, o rodeiam diariamente. Guerrilha
urbana de guitarras de baioneta calada, o comandante Verlaine à frente,
garboso, infantaria de Stoogges, Stranglers e os estrientes Rotten e Vanien, a
pesadíssima carga da brigada Vicious, Patti D'Arc atolando os seus inimigos nas
suas podridões mesntruais, Blondie aparecendo aos soldados, dando-lhes
«forças».
Mas a grande vitória foi a do Valente Flash que arrumou
definitivamente com os adeptos de Arbória e suas plantas neo-psicadélicas
conquistando a residência de Mr. Lima Barreto.
Atrás, as nossas hostes eram compostas pelas mais
repugnantes criaturas amorais, vendidas e vencedoras, cruéis e sofredoras, os
suicidas esquizo coldwavers, pós-punks com os músculos retesados, dentes
cerrados, snifados vindos da praia, alguns chuis e denunciantes camuflados,
órfãos ideológicos, desterrados que apenas de seu tinham o tempo, essa suprema
alienação, esse luxo.
Rock & Droga (R./Trip 2) é uma nova colectânea de
vivências, um snooker de milhares de buracos, onde as multicoloridas bolas caem
para niilisticamente regressarem aos respectivos úteros. Desvio & plagiato
de emoções, com as quais se brinca, trituradora de sentimentos. J.L.B. aparece
Iacchus resplandecente, puro servidor de alguma divina instância,
rejuvenescendo pelas mais mágicas-negras práticas: está aqui mesmo ao lado o
fantasma de Alister Crowley que me lemebra "STAB YOUR DEMONIAC SMILE TO MY
BRAIN / SOAK ME IN COGNAC LOVE AND COCAINE" Cada disco, todos os shows,
alguns momentos puramente eléctriocos referidos ao longo da aventura que ides
(disse o pároco) ler em Rock & Droga estão criteriosamente citados nos
manuscritos do Mar Morto, nas escamas dos brontossáurios, na explosão inicial
que deu origem à Vida (e às vidas - e às gentes da vida), o não-cósmico FLASH
primordial, o que Lovecraft chamou a primeira das 7 Portas: Este é o 2º
Rock/Trip, abram a consciência - ou percam-se - o mais certo é já não
conseguirem fechar qualquer das vossas portas. Desapertem os cintos, fumem, boa
viagem.
Prefácio de RUI REININHO
Do autor: Fernando Jorge da Ponte de Lima Barreto, mais conhecido como Jorge Lima Barreto (Vinhais, 26 de Dezembro de 1949 - Lisboa, 9 de Julho de 2011), foi um músico, escritor, conferencista, improvisador (piano, polinstrumentismo acústico e electrónico), musicólogo e professor assistente das cadeiras de Introdução às Ciências Humanas, Crítica da Cultura e Estética, na Faculdade de Letras do Porto e da Escola Superior de Belas Artes do Porto (1974 a 1978).
Fundador: dos Anar Band (1969), que teve a participação de Rui Reininho; da Associação de Música Conceptual com Carlos Zíngaro (1973); dos Telectu (1981) com Vitor Rua, estes com uma vasta discografia; e do duo Zul zelub, com Jonas Runa (2007). Colaborou entre outros com: Elliot Sharp, Chris Cutler, Sunny Murray, Jac Berrocal, Louis Sclavis, Daniel Kientzy, Giancarlo Schiaffini, Evan Parker, Gerry Hemingway, Paul Lytton, Eddie Prévost.
Licenciado em História em 1973 pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Doutorado em 1993 pela Universidade Nova de Lisboa, com a tese “Música & Mass Media”, e em 2010 com a tese "Estética da Comunicação Musical - a Improvisação".
Realizou também música para teatro, dança, pintura, poesia, vídeo-arte, performance, multimédia e cinema.
Faleceu apenas com 61 anos, vítima de pneumonia.