Estado de conservação: Bom
Referência: 2304100
Em 1935, foi nomeado Conservador do Registo Civil em Marvão, tendo desempenhado as mesmas funções na Nazaré, em 1936. No ano de 1943, é provido no lugar de Conservador do Museu-Biblioteca Conde de Castro Guimarães, de Cascais, onde já residia e onde lançou a experiência das bibliotecas itinerantes, o que foi aproveitado pela Gulbenkian, que o convidou para organizar e dirigir o Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas, dessa mesma Fundação, a partir de 1958, tendo sido o seu primeiro director, até à data da sua morte.
Usou o
pseudónimo de António Madeira, e o seu itinerário artístico pode ser balizado
seguindo a bibliografia adiante inclusa. Colaborou nas revistas Manifesto,
1936, e Litoral, 1944. Foi co-editor das revistas Tríptico, revista de arte,
poesia e crítica (Coimbra, 1924-25), Presença, folha de arte e crítica (de 1927
a 1930) e Sinal, revista literária (Coimbra, 1930).
Se observarmos de perto o quase omnipresente narrador-personagem, não poderemos deixar de ver nele um auto-retrato, do qual se destaca uma permanente hesitação e insegurança, em termos comportamentais, que chega a atingir a desistência, associada à inadaptação a um mundo social que lhe é hostil e que o arrastou para o cepticismo político-social: «todos (os caminhos) vão dar a Roma». Compreendemos, assim, a sua introversão egocêntrica e amargurada, pois «o meu reino é uma ilha». A timidez e cautelas que manifesta perante os vários companheiros de viagem (e perante a mulher, a que nunca acederá) impediram-no sempre de os contrariar ou de se lhes opor, permitindo-nos talvez apreender as razões, tão visíveis na sua obra, da sua extrema susceptibilidade quanto a sentimentos como o de se sentir ridículo ou facilmente vexado: «desprezarem as coisas... mas de que sou escravo, é a pior humilhação... o maior vexame». Para se defender de todos estes constrangimentos e escravidões, o caminho encontrado parece ter sido o do distanciamento das coisas, com a subsequente atitude racionalista e irónica que perpassa em todos os seus textos, devendo o aparente amoralismo e indiferença ética, por outros detectados, mais não ser do que uma resultante óbvia dessa mesma atitude. Na verdade, se o confronto entre personagens é só inicialmente esboçado, é porque as situações conflituosas não devem fazer parte das perspectivas e atitudes do escritor, acabando por diluí-las, ou mesmo anulá-las, por meio de palavras e gestos socializados, tantas vezes através da bonomia, indiferença ou humor, o que não quer dizer que não mostre hostilidade contra os preconceitos políticos e ideológicos que, na altura, faziam eco, mas que considerava inadequados porque sub-repticiamente falsos e enganadores.
Essa mesma habilidade estendeu-a contra a cidade e contra a própria família, enquanto espaços fechados geradores de hipocrisias, dos quais «Curva do Céu» é um símbolo, na figura da criança moribunda, a quem apenas concede o poder de sonhar. Atendendo agora à dinâmica e características globais, quer da obra ficcional, quer do próprio A., dir-se-á que não haveria outra alternativa que não fosse a da criação, como elemento nuclear, de um narrador omnisciente e participante, para se poder assumir como testemunha (e até mesmo como inspector) – «encontro-me a observar-me as reacções... as ideias» – perspicaz e inteligente e que desempenhasse plenamente as funções de condutor interno dessas mesmas narrativas. É que isso permitir-lhe-ia coordenar e ajustar os processos narrativos e introduzir neles as componentes da personalidade artística de Branquinho, mormente a necessidade de confissão e comunhão com o leitor, por meio de uma linguagem directa, coloquial e luminosamente transparente, desnudando intimidades psíquicas (sobretudo através do monólogo e da divagação) e que sentimos como totalmente sinceras e verdadeiras, até porque o destinatário é também o próprio escritor.
Associado a este narrador-personagem, encontraremos habitualmente um companheiro de viagem, formando com ele uma dupla de solitários, por vezes dissimulados, mas sempre interactivos e desencadeadores da acção. A instituição destes dois pólos narrativos facilita a cisão fictícia de um todo, que engendra um esboço de confronto dramático. Num desses pólos, encontraremos uma unidade consubstanciada no viajante mental, o escritor que tem a função de se transcrever e de testemunhar o outro, mas confessadamente sedentário: «para pensar bem é preciso estar quieto», utilizando um discurso metonímico, essencialmente referente de um mundo quotidiano e natural, profundamente racional e lógico, porém estranhamente voluptuoso, elegante, lírico e cândido, numa justaposição de frases eminentemente coordenadas por adversativas – necessárias à premente introdução do inesperado, invulgar e insólito – e tantas vezes expressionistas pela captação subjectiva e deformadora do pormenor que habita o mundo real. No outro pólo, encontramos o mundo da acção, o do viajante dinâmico que se exprime através do diálogo ou dos seus comportamentos, retratando um eu apaixonado, onírico e dramático, gerador de situações enigmáticas, plurissignificantes e intrinsecamente simbólicas. Não será pois de estranhar que esta personagem possa ser, por um lado, agressiva, prepotente ou intimidante, ao começo, e tornar-se depois gentil e afável, mesmo tímida e ingénua, para que se possa estabelecer, entre os dois pólos, a comunhão e uma ponte. É nesta comunhão, «agarrando-lhe no braço, já familiarmente», que os dois vectores se associam num sistema muito bem urdido e coerente, que só uma experiência vivencial própria poderia ter construído. Esta dupla toma existência em vagabundagens nocturnas, no meio das sombras e em espaços sem nome, labirintos e encruzilhadas perdidas algures em solares arruinados, onde o «de repente» e o inesperado brotam a todo o momento, formando um tecido de sonhos, uma paisagem kafkiana, mas sempre real porque psicologicamente coerente e verdadeira.
Sendo a obra do A. constituída por poesia, teatro, romance e contos, só estes denunciam um nível de maturidade que atinge a perfeição, destacando-se O Barão, Rio Turvo e O Involuntário. Ler estas narrativas é ler, de facto, o essencial de Branquinho. Quanto aos restantes trabalhos, quase poderíamos considerá-los «apontamentos» de uma fase experimental, produto de uma verdura da juventude, o que não impede que neles se manifestem positivas realizações do vanguardismo pós-modernista.
De qualquer forma, Branquinho não constrói histórias de amor, como já tem sido sugerido, onde a procura da mulher se torna tema. Os desencontros amorosos são, na verdade, episódicos. Os verdadeiros temas são o da auto-confissão e o do encontro, comunhão e entendimento entre as duas entidades já assinaladas, as duas instâncias de um único «eu» perante o inelutável que será o da mulher etérea, botão de rosa, vestal, «um astro que circundo que é só meu e não habito», reconfirmado pelo «busco...aquela a quem ama a minha alma». Dir-se-á um poeta sem corpo, ainda na «eterna juventude», fechado no seu casulo. Nele, poderemos ver a paixão mas nunca o amor, daí que as suas narrativas sejam uma «viagem / que não começou nem acabou».
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. IV, Lisboa, 1997
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Rodrigo Emílio |
Índice:
01. Cantador
Real
02 . Cantar
até Morrer
03. Ídolo
Que Desponta
04. Um Fio
de Lírismo
05. Egas
Moniz, Malhoa e António Barroso como Ouvintes
06. Uma
Feira de Cantigas
07.
Competidores de Sardinha e de Barbuda
08. Se
Quadrava, uma Sextilha…
09.
Respostas e Contra-respostas
10. Como os
Passarinhos, Como os Rouxinóis
11.
Cantadores e Cantadeiras
12.
Tocadores de Viola, Harmónio e Violão
13.
Anotações e Variantes
14.
Bibliografia
Como disse em tempos Fernando J.B. Martinho, «[…] O livro é
todo ele, com as suas cenas, os seus exercícios, os seus camarins, uma
homenagem ao teatro, e a permanente lembrança de que a poesia é um arte de
passes e passos mágicos, uma arte da prestidigitação, não importa se carecida
ou não de manual. Só espanta que tenha levado tanto tempo que alguém se
lembrasse de fazer a ligação, a correspondência. Outra coisa não pedia uma
poesia que, de há muito, se nos oferecia como ritual, como espectáculo, como
convite à iniciação na ars magna. Então não foi Cesariny que, um dia, celebrou
Artaud e que, por via dele, nos prometeu o «acordar» para uma outra realidade,
para lá do real que temos, susceptível ou não de reabilitação? E não ele também
que saiu a dar-nos e aos actores as boas-vindas no castelo brumoso de um outro
príncipe, expondo-nos, sem piedade, ao "metal fundente" que corre
"entre nós e as palavras"?»
Doutorado em Sociologia, foi assistente na Faculdade de
Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa durante quinze anos,
é investigador associado no Instituto Português de Relações Internacionais
(Universidade Nova de Lisboa) e está, atualmente, a concluir um pós
doutoramento em História com a tese Descolonização e Democratização em
Portugal: O Caso dos Retornados.
Foi crítico literário n'O Independente e na revista Os Meus
Livros e tem colaborado em diferentes jornais e revistas, como Observador,
Visão ou Sábado. Nesta última, assinou, durante mais de quatro anos, uma
crónica semanal subordinada ao título genérico Coração, Cabeça e Estômago.
Além de tradutor, é autor de obras como O Meio Literário
Português Prémios Literários, Escritores e Acontecimentos (1960-1999) (Difel),
Não é Fácil Dizer Bem, Críticas, Obsessões e Outras Ficções (Edições Tinta da
China), Puta Que os Pariu! A Biografia de Luiz Pacheco (Edições Tinta da
China), O Que é Um Escritor Maldito? Estudo de Sociologia da Literatura (Verbo),
Mota Pinto Biografia (Contraponto), Chatear o Camões. Inquérito à Vida Cultural
(Maldoror) ou O Super Camões. Biografia de Fernando Pessoa (Publicações Dom
Quixote).
Grande prosador, Luiz Pacheco foi também um dos melhores
conversadores da imprensa. Estas entrevistas, publicadas nos últimos 20 anos em
jornais e revistas, apresentam-nos uma das vidas mais agitadas da literatura
portuguesa e são bem a expressão de uma inteligência desperta, desafiadora e implacável,
batendo forte e feio em algumas personalidades da nossa vida pública.
Caso humano riquíssimo, impossível de resumir aqui, o mais sensato é dar-lhe a palavra: «Luiz José Machado Gomes Guerreiro Pacheco nasceu em 7 de Maio de 1925 e espera morrer no ano 2000. Está bem-disposto, porque está desempregado. Publicou muitos livros de outros autores. Não se lembra de publicar nada (dele) que prestasse. Escreveu muitas obras e perdeu quase todas. Teve três mulheres, nove [sic] filhos e netos, nem conta. Folhetos de sua autoria: «Os Doutores, a Salvação e o Menino», «Carta-Sincera a José Gomes Ferreira», «O Teodolito», «Os Namorados», «O Cachecol do Artista». Teve 18 valores na admissão. O Urbano teve 12.»
(Texto incluído na «Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e
Satírica», organizada por Natália Correia em 1965.)
«Está para sair um livro com entrevistas suas…
Esse livro é uma merda! Isso é uma aldrabice. É bom para
andar por essas pequenas editoras.»
— Luiz Pacheco, Sol, 2008
Neste livro estão reunidas entrevistas publicadas entre 1992
e 2008. A selecção é da responsabilidade de Luiz Pacheco e de João Pedro
George.
Entrevistadores: Baptista‑Bastos; Carlos Quevedo;
Cláudia Galhós; João Paulo Cotrim; João
Pedro George; Mário Santos; Paula Moura Pinheiro; Pedro Castro; Pedro Dias de
Almeida; Ricardo de Araújo Pereira; Ricardo Nabais; Rodrigues da Silva; Rui
Zink; Vladimiro Nunes.
Grande prosador, Luiz Pacheco foi também um dos melhores
conversadores da imprensa. Estas entrevistas, publicadas nos últimos 20 anos em
jornais e revistas, apresentam‑nos uma das vidas mais agitadas da
literatura portuguesa e são bem a expressão de uma inteligência
desperta, desafiadora e implacável,
batendo forte e feio em algumas personalidades da nossa vida pública.
Caso humano riquíssimo, impossível de resumir aqui, o mais
sensato é dar‑lhe a palavra: «Luiz José Machado Gomes Guerreiro Pacheco nasceu em 7 de Maio de 1925 e
espera morrer no ano 2000. Está bem‑disposto,
porque está desempregado. Publicou muitos
livros de outros autores. Não se lembra de publicar nada (dele) que prestasse.
Escreveu muitas obras e perdeu quase todas. Teve três mulheres, nove filhos e
netos, nem conta. Folhetos de sua autoria: Os Doutores, a Salvação e o Menino,
Carta‑Sincera
a José Gomes Ferreira, O Teodolito, Os
Namorados, O Cachecol do Artista. Teve 18 valores na admissão. O Urbano teve
12.»
(incluído na Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, organizada por Natália Correia em 1965).
O conjunto aqui editado resultou da pesquisa feita no âmbito
da biografia do poeta (Maria Antónia Oliveira, «Alexandre O’Neill, Uma
Biografia Literária», Dom Quixote, no prelo). Pôde constatar-se que, embora o
poeta viesse publicando regularmente desde os finais da década anterior, os
anos 70 eram aqueles em que a sua produção se tornava mais assídua, e em que
mais textos haveriam de ficar confinados às páginas dos periódicos.
Reúnem-se também poemas escritos para os jornais «Diário de
Lisboa» e «A Luta», e para as revistas «Flama» e «Ele». Foram encontrados no
espólio do poeta os poemas «Magritte» e «Azul Ar», bem como os poemas sem
título designados por «Fragmentos», inéditos. Acrescentam-se ainda dois poemas
datados de 1972 que E.M. e Castro e José Alberto Marques incluíram na «Antologia
da Poesia Concreta em Portugal» (Lisboa, Assírio & Alvim, 1973).
Em anexo, publicam-se dois textos com poemas, e uma versão em prosa da primeira parte de «Rã & Descobridor».
O poeta, artista plástico Joaquim Pessoa, autor de poemas como Lisboa, menina e moça e Amélia dos olhos doces, morreu esta segunda-feira, aos 75 anos.
Criticas: "É
conhecido e gosta de ser como libertino. Mas ele é mais libertário que
libertino. Literato, escritor, editor, panfletário, personagem, Luiz Pacheco é
genial, cruel, maldito e maldizente, crítico feroz, dono de um sarcasmo raro,
pai de oito filhos, frutos de variados amores."
Diário de
Notícias, DNA, 13/08/05
"É um
diário sem paralelo na literatura portuguesa. [...] com 80 amos feitos [Luiz
Pacheco continua] um homem vertical, que, a despeito da velhice e da decadência
física, não é habitado pela menor amargura, antes mantém inalterável o seu
proverbial humor mordaz e a sua constante auto-ironia."
Rodrigues da
Silva, JL
"O
Diário Remendado é um romance: o romance de uma vida vivida à beira da privação
e da perdição. O seu protagonista é um tal Luiz Pacheco, um corpo pensante
[...] É a narrativa fragmentária de cinco anos de sobrevivência de um corpo na
sua máxima exposição, desde a reconstrução ficcionada dos sonhos até à
encenação das suas múltiplas doenças, reais ou imaginadas, das estratégias mil
vezes refeitas da publicação literária à evocação sem limites nem elipses das
suas experiências sexuais [...]
António Mega
Ferreira, Visão